Minhas senhoras, meus senhores,
O jovem colega e amigo Minarvino Furtado pediu-nos que participássemos na apresentação do seu livro, versando sobre a contabilidade financeira.
Não podíamos deixar de o fazer, por várias razões:
A primeira, é que se trata de um acontecimento raro, em Cabo Verde, a publicação de um livro em matéria de contabilidade.
A segunda, é que se trata de um ato de coragem, escrever um livro sobre a contabilidade, em língua portuguesa, sendo que os avanços nesta ciência chegam mais depressa a Portugal e ao Brasil, onde já existe abundante literatura na área.
Neste caso, louvamos a coragem de Minarvino Furtado em meter-se numa área já bastante explorada, mas, é assim mesmo, os nossos intelectuais, mestrandos, mestres, doutorandos e doutores, têm de pesquisar e escrever, porque, se não, ficamos somente pela bazofaria, típica do cabo-verdiano, que tem mania que é bom, ou pode ser bom, em tudo, mas que esforça-se pouco, e não apresenta obra feita.
Aproveitamos a oportunidade para vos falar da Revista ABACO, editada pela OPACC-Ordem Profissional de Auditores e Contabilistas Certificados, lançada há alguns meses, cuja Edição nº 2 se encontra em preparação, mas que, não obstante os pedidos de colaboração dos nossos intelectuais, mestrandos, mestres, doutorandos e doutores, na nossa área, pouco ou quase nada temos recebido para publicar. É uma vergonha!
Assim, parece-nos que os poucos cabo-verdianos que deviam esforçar-se em pesquisar e escrever, em matéria de contabilidade, auditoria e gestão financeira, e áreas afins, têm estado mais preocupados com o aspeto material das suas vidas, não se lembrando que têm de honrar a sua intelectualidade e, portanto, têm de pesquisar, refletir e escrever, se querem, deveras, ser respeitados com a designação de mestrandos, mestres, doutorandos e doutores, e de professores universitários, que ostentam.
Deixando a crítica à nossa intelectualidade, vamos ao que mais interessa, aqui e agora, falemos um pouco do livro do Minarvino Furtado, intitulado Contabilidade Financeira-Teoria e Prática.
Já no prefácio, é dito ao que vem o livro de Minarvino Furtado, isto é, destina-se aos académicos e profissionais da área contábil.
Pensamos que, na designação de académicos estão incluídos, no sentido lato, os docentes e discentes, pois, de contrário, teria de haver um Manual do Professor e um Manual do Aluno, o que talvez nem faz sentido, nesta fase, nem terá sido a intenção do autor, na medida em que o mais certo é não ter recebido financiamento suficiente para editar sequer esta obra quanto mais para produzir tais instrumentos didático-pedagógicos, que designámos de Manual do Professor e do Aluno.
Como é típico num Manual de Contabilidade Financeira, o autor faz uma abordagem introdutória e caminha para as operações típicas da contabilidade em curso do exercício, e para as operações de inventário ou seja os trabalhos contabilísticos do final do exercício.
A arrumação do Manual é típica dos livros de Contabilidade Geral e Financeira:
Reflete sobre a informação contabilística e refere aos seus utilizadores mais usuais, que podemos designar de “stakeholders”, ou seja, os principais interessados na informação contabilística.
Apresenta uma divisão da contabilidade que tem em conta os primórdios, de domínio da economia mercantil, e a subsequente necessidade de especialização, fase à revolução industrial (contabilidade de custos) e à tendência atual de domínio crescente da economia de serviços e do controlo de gestão (contabilidade de gestão).
Como não podia deixar de ser, aborda a problemática da harmonização contabilística, que ganhou impulso a partir de 1973, com a criação da IASB-International Accounting Standards Board, e segue hoje numa dinâmica de convergência a nível mundial.
E, como é evidente, faz o ponto da situação da harmonização contabilística, no contexto de Cabo Verde, descrevendo os aspetos essenciais do Sistema de Normalização Contabilística e Relato Financeiro, o nosso SNCRF, baseado nas normas internacionais de contabilidade e de relato financeiro, IAS/IFRS para pequenas e médias entidades.
A partir daí, aborda as operações em curso do exercício, através do estudo das classes e grupos de conta, e da movimentação das respetivas subcontas, dando especial ênfase a aspetos práticos, pois que termina cada capítulo do livro com um conjunto de casos práticos, indo de encontro àquilo que a comunidade académica, docente e discente, atribui grande significado, ou seja, a exemplificação prática dos conceitos teóricos acabados de expor.
Não aprofunda muito as operações de inventário, ou seja as operações típicas do final do exercício e de elaboração das demonstrações financeiras, talvez que esta matéria tenha ficado para futuros desenvolvimentos, mas teve o cuidado de introduzir uma Parte III, onde aborda a problemática da contabilidade de grupos de empresas, e faz referência à concentração de atividades empresariais e ao investimento em subsidiárias, e aborda em traços gerais a consolidação de contas.
Que saibamos, trata-se da primeira obra, acabada, do autor, Minarvino Furtado, que decerto a desenvolverá, no futuro, aprofundando algumas matérias que, agora, foram tratadas mais pela rama.
Talvez porque a intenção tenha sido de proporcionar ao estudante uma sebenta, expositiva da matéria e com exercícios práticos e, ao professor, um guia que aborda as matérias de base da contabilidade financeira, de forma sistematizada, e apresenta casos práticos para resolução ou já resolvidos.
Quiçá, outras obras virão a seguir, não tanto generalistas, mas, mais especializadas, pois sabemos que Minarvino Furtado não está parado, continua a pesquisar e a refletir, como um verdadeiro académico, que almeja completar o seu doutoramento e, por ventura, pós-doutoramentos, pois, nos nossos tempos, é assim que as coisas funcionam.
Terminamos desejando muita força ao jovem autor, Minarvino Furtado, um homem de coragem, e fazendo votos para que os académicos, docentes e discentes, façam bom uso desta obra e, particularmente os docentes, que sigam o exemplo de Minarvino Furtado e coloquem mãos à obra.
Praia, 16 de Março de 2018
João Mendes
Mestre em Controlo de Gestão e Auditoria Interna e Auditor Certificado
Ex-Presidente do Conselho Diretivo da OPACC por dois mandatos e atual Presidente do Conselho Técnico